Passado colonial? Chissano defende "boa cooperação" e não reparações

O antigo Presidente moçambicano Joaquim Chissano rejeita a necessidade de reparações ao país pelo passado colonial português, defendendo em alternativa "boa cooperação" e investimentos em Moçambique por Portugal, mas também recíprocos.

Independências: "Valeu a pena" apesar de quase tudo estar ainda por fazer em Moçambique -- Chissano

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Lusa
09/06/2025 06:12 ‧ há 4 horas por Lusa

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Moçambique

"As reparações é só ter uma boa cooperação, investimentos. E, passado algum tempo, agora, porque os moçambicanos também já estão tendo uma ideia de como se faz um investimento, poderão também investir em Portugal, como os portugueses podem investir aqui", disse o antigo Presidente (1986 a 2005), em entrevista à Lusa, em Maputo.

 

"Eu penso que temos esta abertura para crescermos juntos. E é um espírito que se deve espalhar também por vários países da Europa onde não há superiores e inferiores", acrescentou.

Joaquim Chissano, 85 anos, é o mais antigo dos três ex-Presidentes ainda vivos, e um dos presidentes honorários da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), movimento em que se envolveu, na guerrilha, desde 1963, e que recorda ter sido crucial no processo de independência, que já então era uma convicção e certeza para muitos e há muito tempo.

"E depois, quando foi da luta armada, então a convicção cresceu muito, pelos sucessos que nós tivemos logo nos primeiros tempos dessa luta. Estou a falar de 1964, 1965, 1966, até que houve aquele esforço do exército colonial, criaram uma operação gigantesca que se chamou de 'nó górdio'. E quando nós conseguimos ultrapassar esse 'nó górdio', portanto, desfazer o 'nó górdio', então ficámos com maior confiança. Foi sempre esse o espírito", afirmou ainda.

A operação 'nó górdio' foi a maior campanha militar portuguesa em Moçambique, durante a guerra colonial, decorrendo durante sete meses, em 1970, mobilizando 35.000 militares, para tentar acabar com a entrada de guerrilhas independentistas ao longo da fronteira com a Tanzânia e para destruir as respetivas bases permanentes naquela zona do norte do país.

Chissano sucedeu a Samora Machel, que proclamou a independência em 1975 e morreu num acidente aéreo em 1986, e foi também o primeiro Presidente da República de Moçambique eleito democraticamente, nas eleições multipartidárias de 1994.

Contudo, também recorda que terminada a guerra colonial, com o 25 de Abril de 1974, as negociações para a independência com o Governo português, em que participou, foram "muito sérias" e com a garantia moçambicana de que a "luta não era contra um povo, português".

"Mas que era contra um regime, um sistema, que é o sistema colonial, e acasalado com o apartheid e regimes racistas, era isto. E, portanto, já nas negociações tratámos de encontrar formas de reconciliação e de olharmos um para o outro em termos de igualdade", disse.

"As relações entre Moçambique e Portugal cresceram desde o princípio, sobretudo porque as negociações foram baseadas em pessoas que estavam envolvidas na luta, sabiam o que cada um sofreu. O outro sofreu também. E também havia a compreensão de que Portugal era um país que precisava também de crescer, de se libertar", apontou.

Portanto, acrescentou o antigo Presidente, "era uma luta para os portugueses, como era uma luta para os moçambicanos. Então, houve uma boa compreensão".

E a confiança que Chissano diz ter visto há mais de 50 anos é a mesma que vê hoje nos moçambicanos mais novos, apesar das dificuldades: "Eu creio que o nosso povo acredita que vamos operar transformações. O que precisamos é sempre ir corrigindo os desvios que acontecem. Há guerras entre nós, embora suscitados de estrangeiros, depois há guerras entre nós. E vamos corrigindo e vamos aumentando a nossa unidade e a nossa resiliência".

A União Africana definiu 2025 como o ano da "Justiça para os Africanos e as Pessoas de Descendência Africana, através de Reparações", e a chefe da diplomacia moçambicana garantiu o apoio do país a esta pretensão, precisamente quando se assinalam os 50 anos da proclamação da independência de Moçambique do domínio colonial português.

"É reconhecida a natureza sensível, delicada, pois envolve também reparações pelas deportações, massacres em massa, detenções arbitrárias, recurso à tortura, pilhagens de recursos naturais e os ensaios nucleares com impactos humanos e ambientais catastróficos, no tempo da colonização", disse a ministra dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Maria Manuela Lucas, em 25 de maio, dia de África.

Recordou que a escolha deste tema teve subjacente o facto de a União Africana, "nas suas reflexões sobre o passado, ter achado que era chegado o momento para, com alguma serenidade", África, em coordenação com a Comunidade das Caraíbas e a diáspora africana, movimentos pan-africanistas, entre outros, "revisitarem aquela que terá sido uma das páginas mais negras da história da existência dos povos africanos".

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