O The New York Times deu destaque, na terça-feira, a Maria Teresa Horta, poetisa e "escritora feminista portuguesa" que morreu no passado dia 4 de fevereiro, na sua casa, em Lisboa, aos 87 anos.
Como recorda o jornal norte-americano, Maria Teresa Horta que "ajudou a quebrar as restrições de seu país conservador sobre as mulheres", era "a última sobrevivente das célebres escritoras conhecidas como as 'Três Marias', que juntas escreveram o livro de referência 'Novas Cartas Portuguesas', de 1972".
"Uma coleção de cartas que as mulheres escreveram umas às outras sobre seus problemas como mulheres em Portugal, abriu um mundo de sexualidade feminina reprimida, enfureceu a ditadura desajeitada do país e levou à prisão e processo criminal contra delas, sob acusações de indecência e abuso da liberdade de imprensa", lembra o jornalista Adam Nossiter.
Esta não é a primeira vez que o The New York Times escreve sobre Maria Teresa Horta e as 'Três Marias'. Num artigo de julho de 1973, o jornal norte-americano escrevia: "Para as feministas de todo o mundo, bem como para os defensores da imprensa livre, a ação policial contra as mulheres portuguesas em junho de 1972 foi um ultraje que lentamente se tornou o foco de um movimento de protesto internacional".
Considera assim Adam Nossiter que as 'Três Maria — Maria Teresa Horta, (1937-2025), Maria Isabel Barreno (1939-2016) e Maria Velho da Costa (1938-2020) — tornaram-se "heroínas populares feministas internacionais", e a fama do livro alertou o mundo "sobre a repressão causada pela ditadura portuguesa".
Simone de Beauvoir, Marguerite Duras e Adrienne Rich estavam entre as escritoras que declararam seu apoio público. A Organização Nacional para Mulheres votou para fazer do caso sua primeira causa feminista internacional.
Mas este não foi o primeiro caso controverso em que se envolveu Maria Teresa Horta, como relembra a publicação. Em 1967, foi "espancada na rua", após a publicação de seu "inovador" volume de poesia, 'Minha Senhora de Mim', contou à sua biógrafa Patrícia Reis, em 2019.
Aquele livro "desafiou algo profundamente enraizado neste país: o silenciamento da sexualidade feminina", disse ela, há cinco anos, revelando que, a partir daí, "batidas frequentes na porta da polícia secreta portuguesa passaram a fazer parte" do seu dia a dia.
Já em 2018, a um jornalista italiano, Maria Teresa Horta tinha descrito pelo que tinha passado: "Eu nasci em um país fascista, um país que roubou a liberdade, um país de crueldade, prisões, tortura [...] E eu percebi muito cedo que não podia suportar isso".
O The New York Times recorda ainda como é que as 'Três Marias' juntaram-se, sobre o que escreveram, a perseguição que sofreram. Lembra que nenhuma, nem no leito da morte, confessou quem escreveu o quê polémico 'Novas Cartas Portuguesas', tal como prometeram, em 1972, umas às outras.
Por fim, fala do 'currículo' de Maria Teresa Horta, que nasceu em Lisboa a 20 de maio de 1937, filha de Jorge Augusto da Silva Horta, "um proeminente médico e conservador que apoiou a ditadura", e Carlota Maria Mascarenhas. A sua avó paterna tinha sido "proeminente no movimento sufragista português".
Maria frequentou o Liceu Filipa de Lencastre, licenciou-se na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e publicou o seu primeiro livro de poesia aos 23 anos.Acabou por escrever mais cerca de 30, bem como 10 romances.
A lisboeta "também foi crítica e repórter de vários jornais e editora literária de A Capital". Na década de 1980, editou a revista feminista Mulheres, que era ligada ao Partido Comunista Português, do qual foi militante de 1975 a 1989.
"Não importava o gênero — poesia, ficção ou jornalismo — ela considerava escrever um dever público", descreve o jornal norte-americano.
Maria Teresa Horta ganhou a maioria dos principais prémios literários do país, mas voltou a causar polémica quando, em 2012, se recusou a aceitar o Prémio D. Dinis "por se opor à política de direita do Governo".
A 'ativista' deixa um filho, Luis Jorge Horta de Barros, e dois netos. O marido, o jornalista Luis de Barros, ex-editor do jornal O Diário, faleceu em 2019.
O The New York Times concluiu o texto com uma das frases mais conhecidas de Maria Teresa Horta, dita à Guernica, em 2014: "As pessoas perguntam-me por que sou feminista [...] Porque sou uma mulher de liberdade e igualdade e não é possível ter liberdade no mundo quando metade da humanidade não tem direitos".
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