É um rosto desconhecido da maioria. Mas aquilo que as suas mãos já desenharam, tornam-no muito mais conhecido do que possa imaginar. Para os mais velhos, podemos falar de ‘Bob, o Construtor’. Para as gerações mais novas, não há dúvida de que ‘Patrulha Pata’ chamará a atenção.
O sucesso de Keith Chapman remonta à década de 90, altura em que criou um dos seus primeiros grandes sucessos. Falamos de ‘Bob, o Construtor’, um personagem que entrou pela casa dos portugueses, influenciando o seu imaginário e acompanhando muitos no seu crescimento.
Já mais recentemente, Keith desenvolveu aquilo que se pode considerar, pelo menos até ao momento, o maior trabalho da sua carreira. A ‘Patrulha Pata’ já percorreu o mundo, conta com mais de dez temporadas, já chegou ao cinema e é um dos desenhos animados mais apreciados pelos mais novos, com um sucesso global. Depois do sucesso desta última série, poder-se-ia perguntar como é que Keith pretende superar o êxito já alcançado: a resposta vem em formato de… desenho.
Chama-se ‘Jonny Jetboy’, estreia este fim de semana no Canal Panda, e é a mais recente criação do produtor britânico, de 66 anos. No âmbito desta estreia, Keith Chapman esteve à conversa com o Notícias ao Minuto, onde revelou a inspiração para este novo desenho, os desafios que enfrenta hoje em dia no âmbito da criação de séries infantis e a forma como encara a missão de ensinar, em cada projeto, uma mensagem aos mais novos.
Pensei nisto como sendo um ‘Top Gun’ para crianças
‘Jonny Jetboy’ vai estrear no próximo fim de semana em Portugal. Qual é a mensagem deste personagem e a inspiração para a sua criação?
Este foi um projeto que demorou algum tempo a desenvolver-se. O ‘Jonny Jet’ foi vendido no Canadá, onde se fez um grande trabalho de desenvolvimento, com o apoio de uma companhia de streaming chinesa, uma espécie de Netflix da China. Eles patrocinaram a produção do Jonny, o que foi algo fora do comum. Nunca me tinha acontecido isso, ou seja, um caso em que uma companhia chinesa quisesse patrocinar por completo um trabalho meu, ainda por cima, um trabalho de animação. Foi muito bom!
Para mim tem sido uma experiência incrível, trabalhar com pessoas diferentes, artistas diferentes, e ver o que os escritores ocidentais fizeram com o design do Jonny. Fizeram um excelente trabalho.
A ideia surgiu um dia quando pensei: “Quão fixe seria se um miúdo tivesse acesso a toda uma série de jatos, e que adora andar depressa, e que pudesse usar estes jatos para proteger o seu bairro daqueles que o ameaçam e que são maus?” Uma espécie de Tom Cruise em criança, e adorei a ideia. Pensei nisto como sendo um ‘Top Gun’ para crianças.
Tem uma apreciação especial pelo Tom Cruise?
Sim, claro! Sou um grande fã. Tudo o que ele faz é espetacular.
E esta personagem, o que é que tem de especial?
Para mim, o mais espetacular, é o facto de ele se poder tornar no miúdo mais rápido do mundo, e toda a tecnologia que está associada a ele, em especial, a sua luva, que pode ser usada como um gadget doméstico, por exemplo para mexer a comida. Com aquela luva, tudo aquilo em que ele põe a mão, dá-lhe um 'boost', uma maior rapidez. Com a sua luva ele é supertalentoso e transforma-se no maior piloto do mundo. E por norma acaba por salvar o dia. E tem também muita comédia envolvida.
O Jonny é rebelde, mas tem um grande coração. É uma espécie de 'Top Gun' britânico. Ele quebra as regras. E depois tem uma relação muito engraçada com a sua irmã, uma relação normal de irmãos, em que ela se chateia porque deveria ser ela a cuidar dele, mas o Jonny faz as coisas à sua maneira.
Mas fundamentalmente, o mais importante, é que ele persegue os homens maus e aquilo que tentei fazer, para manter a série mais chamativa, foi criar um número suficiente de personagens maus, para todos os episódios serem apelativos. É um pouco como o Batman, quando ele luta com o Joker ou com o Pinguin.
O 'Jonny Jetboy' pretende ensinar que qualquer pessoa pode tornar-se num herói. Como é que vai fazê-lo?
A mensagem subliminar é ensinar os miúdos. Eles não são realmente capazes de ir a uma cave e saltar para um jato e transformar-se num herói [como o Jonny] mas podem imaginar-se a transformar-se num herói. Isso é o interessante da imaginação.
Acredito que podemos tentar ensinar os miúdos o caminho correto e o que estão a fazer errado. Essas mensagens estão nas séries. Mas é importante que essa mensagem venha de todo o lado – pais, professores, das coisas que vemos…Sempre que escreve uma história, pretende ensinar uma lição aos mais novos? Sente que essa é a sua principal missão enquanto criador de séries infantis?
Na maioria dos trabalhos que fiz, tentámos sempre incluir no guião mensagem subliminares que os miúdos vão agarrar, por exemplo a ideia do 'bom versus mau' e a mensagem de que recompensa ser-se bom. Essas mensagens estão sempre lá, mas também é sobre a bondade, ser-se bom para as pessoas, ser respeitador, como partilhar… Tentamos construir isso tudo, de alguma maneira, nos guiões. Mas fazemo-lo de uma forma que não seja demasiado evidente. Tem de ser feito numa forma que entretenha. Eles estão a seguir uma grande aventura, mas vão recebendo essas mensagens.
Vivemos numa época em que os miúdos parecem ser cada vez mais maus uns com os outros. Acha que o seu trabalho tem a capacidade de mudar isso e de os inspirar a serem melhores pessoas?
Gosto de acreditar que ajuda. Penso que [ser-se mau] seja natural. Encontramos sempre meninos a serem maus, a fazerem comentários depreciativos, é parte da natureza humana. Acredito que podemos tentar ensinar os miúdos o caminho correto e o que estão a fazer errado. Essas mensagens estão nas séries. Mas é importante que essa mensagem venha de todo o lado – pais, professores, das coisas que vemos… Se receberem essas mensagens, esperemos que comecem a perceber e possam ser miúdos melhores.
Keith Chapman com 'Bob, o Construtor'© Getty Images/Fiona HansonPA Images
Os seus principais papéis são compostos por super-heróis masculinos. Porquê e estará nos seus objetivos futuros fazer uma série com uma super-heroína?
Tem razão! O meu primeiro trabalho ‘Bob, o Construtor’ era protagonizado por um homem. Mas, não sei se conhecem aí em Portugal, fiz uma segunda série que era a ‘Fifi and the Flowertots’. A protagonista era uma pequena flor e criei-a porque as mães me questionavam: "Porque não faz um desenho para as meninas? Não há nada do género". E foi aí que criei a Fifi, da Dreamworks. Deveriam voltar a ser exibido porque é um espetáculo adorável.
Mas assumo que, desde o meu primeiro casamento, tive três meninos. Tenho, por isso, tendência para ideias de rapaz… Mas agora, tive uma menina, resultado do meu segundo casamento, e estou a pensar mais em séries que tenham personagens femininas. Tenho algumas coisas em desenvolvimento em que estou a trabalhar e que espero um dia conseguir um patrocinador para elas.
Já disse anteriormente que "é muito mais difícil criar um programa de TV com sucesso agora do que quando criou ‘Bob, o Construtor’". Quais são os desafios que mais enfrenta?
Penso que o problema para os criadores é que atualmente as emissoras não têm dinheiro, não tem orçamentos… Séries bem sucedidas como a ‘Patrulha Pata’, a ‘Porquinha Peppa’ ou a ‘Bluey’ têm um investimento anormal, que aporta vários riscos.
Hoje em dia, há muitas ideias, portanto é mais difícil escolher naquilo em que se quer investir. Para que uma série consiga investimento, é preciso que ela consiga captar a imaginação dos investidores. Eles têm que querer muito e isso não é nada fácil.
‘Patrulha Pata’ a par com ‘Bob, o Construtor’, são das séries infantis de maior sucesso em Portugal. Como é saber que há milhões de crianças em todo o mundo a admirar o nosso trabalho?
Sinto um grande orgulho em saber que as minhas criações televisivas são apreciadas por crianças de todo o mundo. Se isso os mantém entretidos e se aprendem alguma lição com elas, para mim faz tudo valer a pena.
Alguma vez imaginou que a história de um rapaz e seis cães teria tanto sucesso como teve? O que é que torna estes desenhos animados tão especiais?
Eu tinha um pressentimento de que a 'Patrulha Pata' iria agradar às crianças, mas não podia imaginar que fosse nesta dimensão. Os temas emocionantes de salvamento e emergência, com os cães como heróis, o animal de estimação mais popular do mundo, e com veículos de alta tecnologia que se transformam, provaram ser uma fórmula vencedora. A série de televisão atrai tanto rapazes como raparigas de uma vasta faixa etária, dos 2 aos 7 anos, o que também ajudou a transformá-la num êxito mundial. E os filmes atraíram agora um grupo de fãs ainda mais velho.
É preciso muito esforço para produzir uma série televisiva. Mas para construir essas marcas raras, que rendem milhares de milhões de dólares, também é preciso um pouco de sorte e muito pó mágicoAs pessoas admiram os seus desenhos, mas muitas podem não saber quem é Keith Chapman. Como é que lida com isso? É algo que lhe agrada ou algo que gostaria de mudar?
Prefiro que as minhas personagens sejam as famosas, reconhecidas em todo o lado. Gosto de assistir aos espetáculos de teatro ao vivo e aos encontros nos centros comerciais, misturando-me com os milhares de crianças e pais que estão ali para ver as suas personagens heroicas, e ninguém sabe quem eu sou. Gosto do anonimato!
Disse que o seu trabalho enfrenta um grande desafio, que é o facto de as crianças terem agora mais escolhas. Qual é o "pó mágico" que utiliza para garantir que o seu trabalho se torne um sucesso?
Com a minha experiência em publicidade, consigo colocar-me no espírito de qualquer grupo etário e tenho um bom instinto para saber o que as crianças podem gostar. Depois, é tudo uma questão de encontrar ideias originais e grandes, com uma USP distinta, uma proposta de venda única, e trabalhar nelas até ficarem perfeitas. Depois, tenho de encontrar os parceiros certos para ajudar a fazer o programa: os melhores produtores, realizadores, argumentistas, animadores, dubladores, músicos, parceiros de licenciamento e distribuição, etc. É preciso muito esforço para produzir uma série televisiva. Mas para construir essas marcas raras, que rendem milhares de milhões de dólares, também é preciso um pouco de sorte e muito pó mágico!
Apesar desses desafios, é autor de espetáculos de grande sucesso como ‘Bob, o Construtor’ e ‘Patrulha Pata’. Acredita que ‘Jonny Jetboy’ tem o que é preciso para alcançar o mesmo tipo de sucesso?
Nunca sabemos como é que estas séries vão ser recebidas pelo público e como é que os miúdos vão gostar das personagens e das suas ações. Nunca o conseguimos prever. No fim de contas, é sobre ter alguma tração, conseguir uma audiência, o merchandising também tem um papel muito importante porque os miúdos tem de ter uma forma de estender a sua relação com estes personagens (jogos, brinquedos). Tudo é importante para o sucesso da série.
E depois temos que ter o dinheiro. É preciso esse bocadinho de sucesso para ganhar a confiança, para investir mais e depois começar a construir a marca e seguir para a serie 2 e 3.
A ‘Patrulha Pata’ é um caso incrível. Acredito que Jonny vai conseguir encontrar a sua audiência e depois vamos poder seguir para outra temporada.
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