Saúde mental. A fama 'flash' pode ser devastadora? Falámos com psicóloga

O caso de Nuno da Silva chocou o país no início da semana. Desde o relato nas redes sociais à tentativa de homicídio do filho, vários indícios mostram que algo não estava bem com o ex-concorrente do programa televisivo 'Love on Top'. O Lifestyle ao Minuto falou com a psicóloga Filipa Gonçalves para tentar enquadrar o trágico incidente.

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Adriano Guerreiro
21/10/2024 08:30 ‧ 21/10/2024 por Adriano Guerreiro

Lifestyle

Saúde mental

Desde terça-feira que Nuno Silva, 31 anos, está em prisão preventiva após ter tentado matar o filho de cinco anos. O ex-concorrente do programa televisivo 'Love on Top' usou as redes sociais para partilhar uma mensagem que tanto tinha de perturbador quanto emotivo.

 

Relatou os abusos que sofreu em criança e falou sobre as tentativas de suicídio ao longo da vida. Esteve num programa de televisão e granjeou de atenção mediática de forma muito rápida, mas também fugaz. Será que este pode ser um fator contributivo para algum tipo de perturbação com potencial para atos do género? 

"Ao longo da vida, existem pessoas que vão criando uma frustração e vazio muito grande dentro delas. A fama em modo ‘flash’ pode agravar ou perturbar ainda mais essas pessoas”, começa por dizer a psicóloga Filipa Gonçalves, da Clínica Parque do Estoril, da Cordeiro Saúde, em entrevista ao Lifestyle ao Minuto.

"Muitas vezes, ficam sujeitas a comentários e a uma exposição de grande dimensão e é necessário terem ferramentas para lidar com isso, bem como o fato de rapidamente deixarem de ser 'adoradas' para passarem a ser 'esquecidas'", continua a especialista.

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Filipa Gonçalves é psicóloga da Clínica Parque do Estoril, da Cordeiro Saúde
© Cordeiro Saúde  

Quando alguém expõe a sua história ou vida pessoal nas redes sociais pode ser para expôr o que tem, o que sente, o que está a fazer, mas também pode ter como objetivo manipular aquele que está a ler. Ao longo de todo o relato, é visível que o autor do texto se vê/se sente como uma vítima de tudo o que lhe aconteceu até hoje

Aponta ainda alguns dos fatores que podem criar uma exposição e vulnerabilidade maiores neste casos: "Falta de amor ou afeto, sentimento de inferioridade em relação aos outros, dificuldade em atingir os seus objetivos, baixa autoestima ou até mesmo pessoas que tenham alguma perturbação psicológica, são fatores que podem contribuir para isso."

A especialista sublinha que tentar pôr a vida de um filho em perigo é sinal de algo muito grave a nível mental (a par dos óbvios contornos criminais): "A missão de qualquer pai é a de proteger, cuidar e assegurar o bem-estar dos seus filhos. A natureza é assim. Quando um pai maltrata, exerce violência ou pensa em tirar a vida a um filho é porque algo está errado."

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No texto que partilhou antes deste ato, Nuno Silva tentou mostrar o que se passava consigo e racionalizar o ato que tentou cometer. Esta poderá ter sido também uma vez uma forma de 'manipular' quem o lia, adianta a especialista. “Quando alguém expõe a sua história ou vida pessoal nas redes sociais pode ser para expôr o que tem, o que sente, o que está a fazer, mas também pode ter como objetivo manipular aquele que está a ler. Ao longo de todo o relato, é visível que o autor do texto se vê/se sente como uma vítima de tudo o que lhe aconteceu até hoje.

Muito foram os que ficaram em chocados com as palavras do ex-concorrente: "As palavras e pormenores relatados naquele texto são muito agressivos e levam a nossa mente para uma zona muito assustadora, muito sombria e ficamos a imaginar quão perverso e doentio o ser humano pode ser."

Filipa Gonçalves aponta a necessidade - na perspetiva do leitor - de filtrar a informação que se recebe diariamente: "É importante fazermos um filtro daquilo que lemos ou ouvimos no nosso dia a dia, pois existem relatos ou notícias que podem perturbar durante muito tempo o nosso bem-estar psicológico."

A importância de ajudar e sinais de alerta

É ainda de extrema importância ajudar quem, visivelmente, está com algum tipo de perturbação. "Familiares e amigos não devem deixar muito tempo a pessoa sozinha e devem mostrar que efetivamente os profissionais de saúde existem para encaminhar, apoiar, orientar, dar ferramentas e condições para a pessoa poder encontrar a sua estabilidade cognitiva/emocional."

A psicóloga deixou ainda alguns sinais de alerta: "Quando temos alguém ao nosso lado e sentimos que o comportamento dessa pessoa tem vindo a sofrer alterações, se sentimos que envolve alguma tristeza, inibição, irritabilidade, impulsividade, se a pessoa tem mudanças na alimentação sem querer, ou no sono, se a pessoa deixa de querer combinar coisas, planear o futuro ou se chega mesmo a verbalizar que não sente vontade em viver."

Contudo, é algo que pode tornar-se complicado devido ao uso de um certo tipo de máscaras por parte das pessoas. "Muitas vezes, as pessoas sentem e têm momentos de enorme dor, sofrimento e angústia e isso pode ser camuflado. É fácil passar para fora um sorriso para não se ser questionado, ou por a pessoa achar que não vai ser compreendida, que vai ser julgada ou até mesmo porque efetivamente não tem força, não tem energia para pedir ajuda.”

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Se estiver a sofrer com alguma doença mental, tiver pensamentos auto-destrutivos ou simplesmente necessitar de falar com alguém, deverá consultar um psiquiatra, psicólogo ou clínico geral. Poderá ainda contactar uma destas entidades:

SOS Voz Amiga (entre as 16 horas e as meia-noite) - 213 544 545 (número gratuito) - 912 802 669 - 963 524 660

Conversa Amiga (entre as 15 e as 22 horas) - 808 237 327 (número gratuito) e 210 027 159

SOS Estudante (entre as 20 horas e a uma da madrugada) - 239 484 020 - 915246060 - 969554545

Telefone da Esperança (entre as 20 e as 23 horas) - 222 080 707

Telefone da Amizade (entre as 16 e as 23 horas) – 228 323 535

Todos estes contatos garantem anonimato tanto a quem liga como a quem atende. No SNS24 (808 24 24 24), o contacto é assumido por profissionais de saúde. Deve selecionar a opção 4 para o aconselhamento psicológico. O serviço está disponível 24 horas por dia, sete dias por semana.

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