Motorista atacado não perdoa quem lhe pegou fogo: "Vi a minha vida fugir"

O funcionário da Carris queimado na noite dos desacatos após a morte de Odair Moniz recordou o ataque e garantiu que pediu aos autores para o deixarem sair do autocarro antes de lhe pegarem fogo, "mas não deixaram".

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27/11/2024 22:29 ‧ há 10 horas por Notícias ao Minuto

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Lisboa

O motorista da Carris que foi queimado durante o ataque ao autocarro que conduzia, numa das noites dos tumultos na Grande Lisboa, após a morte de Odair Moniz, há um mês, recordou a noite do ataque e afirmou que ainda pediu para que o deixassem sair do autocarro, mas os atacantes não deixaram. O homem acabou por ficar com várias partes do corpo queimadas e por ser internado na unidade de cuidados intensivos.

 

"Começam a enviar cocktails molotov para cima de mim. Sinto logo que fica um cheiro de combustível. Foi só um indivíduo dar faísca e eu começo a pegar fogo. A chama foi toda ao meu encontro. (…) Porque é que não me deixaram sair e pegavam fogo ao autocarro? Eu pedi para me deixarem sair", questiona o motorista, em entrevista à TVI.

Antes de fugir do autocarro, o motorista só teve tempo de pegar no telemóvel "com a mão esquerda, que estava a arder".

Já na rua, começou a correr e a gritar por uma ambulância, enquanto apagava o fogo "da cara e da cabeça com a mão direita". "Tanto que olho para a mão e a pele, literalmente, saiu toda. Ficou em carne viva", recordou o homem.

Quando as equipas de emergência chegaram, o motorista estava numa rua sem saída, sozinho, e a ambulância não conseguia chegar até ao local. "Então tive de andar o trajeto todo até à ambulância, uns 150 metros a subir, a cambalear. Chego à ambulância já mais para lá do que para cá. Induzem-me logo em coma e aí apago. A partir daí só acordo uma semana depois", lembrou.

"Estava no dia errado à hora errada"

Um mês depois do ataque, o motorista só quer recuperar para poder regressar ao trabalho, mas não tem dúvidas de que o trauma lhe "vai ficar para a vida". "Não faço mal a ninguém. Tenho o meu pai com Alzheimer, ajudo sempre o próximo e aconteceu-me a mim, não sei porquê. Estava no dia errado à hora errada", afirmou a vítima.

Por causa das queimaduras, o homem ficou com lesões nas mãos, tornozelos e ainda está a fazer exames para saber se tem lesões nos pulmões. A recuperação é "lenta" e não está a ser fácil.

"Olho para as minhas mãos e não gosto, não tenho paciência porque é uma recuperação lenta. Tenho muitas dores, tanto com frio como com sol. Marcaram-me sem motivo aparente", desabafou o motorista.

"Espero que paguem pelo que me fizeram"

Aos autores do ataque, o motorista da Carris só pede que se "faça justiça". "Estas pessoas têm de ser presas e pagar por aquilo que fizeram. Isto vai ser um marco para a minha vida toda", afirmou.

Questionado sobre se algum dia conseguirá perdoar, o homem afirmou que "não aceitaria um pedido de desculpas". "Isto não se faz a ninguém. Ainda por cima a uma pessoa que está a trabalhar, a fazer o seu trabalho. Isto não tem desculpa. Foi o pior momento da minha vida, garantidamente. Vi a minha vida a fugir. Tive o instinto de sobrevivência. Hoje pergunto-me como consegui", rematou.

Este foi o ataque mais grave da onda de tumultos que se seguiram em Lisboa - e que estão a ser investigados - depois de Odair Moniz, de 43 anos, ter sido baleado por um polícia, na sequência de uma alegada perseguição, no bairro da Cova da Moura, na madrugada do dia 21 de outubro.

Durante vários dias foram incendiados contentores do lixo, autocarros e carros, o que levou a PSP a deter algumas pessoas logo na altura.

Leia Também: PJ monta operação para deter suspeitos de ataque a motorista de autocarro

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