"O país tem problemas estruturais, mas penso que no curto prazo o essencial era conseguir baixar a temperatura e acho que, neste aspeto, o Governo conseguiu tomar posse, estabilizar minimamente o país e voltar a garantir a normalidade mínima", disse à Lusa João Feijó, analista e pesquisador moçambicano.
O ex-candidato presidencial Venâncio Mondlane, que rejeita os resultados das eleições de 09 de outubro, liderou nos últimos cinco meses a pior contestação aos resultados eleitorais que o país conheceu desde as primeiras eleições multipartidárias (1994), com protestos em que quase 400 pessoas perderam a vida em confrontos com a polícia, segundo dados de organizações da sociedade civil, degenerando, igualmente, em saques e destruição de empresas e infraestruturas públicas.
Contudo, em 23 de março, Mondlane e Chapo encontraram-se pela primeira vez e foi assumido o compromisso de acabar com a violência pós-eleitoral no país, embora, atualmente, críticas e acusações mútuas continuem nos posicionamentos públicos dos dois políticos.
O analista moçambicano tem "dúvidas" se o Presidente do país vai cumprir o compromisso com Mondlane a "curto e médio prazo", mas, salientou, "há esse sucesso da parte do Governo, conseguiu tomar posse, consegue pôr as pessoas a circular minimamente".
Feijó apontou também, como marco dos primeiros 100 dias de governação de Chapo, a "violência descarada" que "deixou de ser visível à luz do dia".
"Mas continuam-se a caçar líderes da oposição, eliminando-os, enquanto à luz do dia falam em paz e este novo Presidente usa muito a encenação, faz muita encenação de um religioso que procura a paz, mas que, depois, na calada, por trás, continuam a ser usados os métodos sinistros de assassínios e eliminação de líderes de oposição", disse o analista moçambicano.
Segundo João Feijó, o novo Governo não conseguiu resolver em 100 dias os problemas nos setores da educação e da saúde, tal como tinha prometido, apontando as constantes greves, para além de "uma tentativa muito grande" de controlar a comunicação social, permitindo-lhes apenas um "papel oficioso de reproduzir o discurso", para se legitimar no poder.
"Em termos económicos não há capacidade nenhuma de resolver os problemas que existem no país, faz-se certa encenação de uma linha de crédito e de medidas de apoio às empresas, mas, na prática, não vão ter efeito nenhum em 100 dias, o impacto é praticamente nulo ou meramente paliativo, o país tem problemas estruturais", disse.
Já o jornalista moçambicano Fernando Lima salientou que o mais importante na administração Chapo foi o fim das manifestações, elogiando o encontro entre Mondlane e Daniel Chapo.
"Mas isso é muito pouco, embora os ganhos estão à vista, porque a tensão baixou muito no país (...). Acho que foi um passo na direção certa, mas não é suficiente. Há muitas forças que estão a conspirar contra esse aperto de mão, veja-se o que aconteceu em Quelimane, no atentado contra Joel Amaral e também todos os bloqueios que tentam estabelecer em relação ao Mondlane", disse Lima, que vê o país "mergulhado" numa nova crise se o diálogo entre Mondlane e Chapo não prosseguir.
No domínio económico e social, para Lima, é "um bocadinho ver para crer", face aos anunciados projetos de habitação para jovens, e do combate ao desemprego e financiamento a iniciativas de empreendedorismo, domínios que, no seu entender, não podem ser resolvidos em 100 dias.
"As mudanças na polícia e nas alfândegas são encorajadoras, mas isso tem que se traduzir em mudanças, nomeadamente na corrupção e numa nova atitude da polícia em relação aos cidadãos e em relação aos raptos", acrescentou o analista moçambicano.
O Governo moçambicano aprovou, em fevereiro, um plano com 77 medidas a realizar nos primeiros 100 dias de governação do quinquénio 2025-2029 e "com impacto direto no bem-estar da população".
Esta agenda surge num momento de sucessivas manifestações e paralisações no país, em que o Governo confirmou, anteriormente, pelo menos, 80 óbitos, além da destruição de 1.677 estabelecimentos comerciais, 177 escolas e 23 unidades sanitárias durante as manifestações.
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