Uma investigação publicada na revista Nature por uma equipa de investigadores liderada pela UNSW (Universidade de Nova Gales do Sul), na Austrália, apontou as causas do aquecimento das águas do Oceano Atlântico Norte a um ritmo sem precedentes, no verão de 2023.
"A intensidade do aquecimento nesse único verão foi equivalente a aproximadamente duas décadas de aquecimento no Atlântico Norte", realçou o autor principal, Matthew England, da UNSW Sydney, citado na quarta-feira pela agência Europa Press.
"Embora estes eventos extremos de temperaturas sejam tipicamente temporários, podemos esperar que se tornem mais frequentes no futuro", alertou.
Na altura, England estava a investigar uma região de arrefecimento no Atlântico Norte. Este chamado "ponto frio" a sudeste da Gronelândia é uma das consequências mais invulgares do aquecimento global, um sinal da desaceleração da Circulação Meridional do Atlântico (AMOC), um cenário popularizado pelo filme de Hollywood "O Dia Depois de Amanhã" ("The Day After Tomorrow", em inglês).
Estas águas tinham vindo a arrefecer nos últimos 50 a 100 anos, pelo que, quando England e a sua equipa observaram um aumento repentino da temperatura da água em toda a região, perceberam que estavam a testemunhar um fenómeno invulgar.
"Chegámos a perguntar-nos se era um regresso temporário da circulação, mas a taxa de aquecimento foi demasiado rápida para que isso acontecesse", explicou.
O oceano pode ser considerado como duas camadas, uma camada superior, diretamente afetada pela radiação solar, e o oceano profundo, mais frio.
Com o aumento da exposição solar durante a primavera e o verão, a superfície do oceano aquece gradualmente.
Em junho e julho de 2023, os ventos do Atlântico Norte estavam mais fracos do que nunca, "portanto, a superfície do oceano estava mais estreita do que nunca", frisou o coautor do estudo da UNSW, Alex Sen Gupta.
Em algumas áreas, a profundidade era de apenas 10 metros, em comparação com os habituais 20 a 40 metros, de acordo com os cálculos do coautor Zhi Li, também da UNSW, que liderou a análise das observações oceânicas para o estudo.
"Isto significa que o sol aqueceu a superfície do oceano mais rapidamente do que o normal, levando a temperaturas recorde", detalhou Li.
O investigador apontou que o adelgaçamento temporário provocado por ventos mais fracos do que o normal também foi impulsionado pelo aquecimento global.
O aquecimento a longo prazo faz com que a superfície do oceano se torne menos densa, o que suprime a capacidade dos ventos de misturar a camada superior.
Os cientistas consideram que, possivelmente, terá havido outro fator inesperado e localizado nesse verão. Em 2020, foram introduzidas novas regulamentações internacionais para reduzir a poluição por enxofre emitida pelos navios.
O objetivo era melhorar a qualidade do ar ao longo das principais rotas marítimas do mundo.
Mas céus menos poluídos podem ter um efeito secundário não intencional, pois menos cobertura de nuvens significa que mais luz solar pode atingir a superfície do mar, especialmente no Atlântico Norte, uma área de elevado tráfego marítimo.
No entanto, England sublinhou que este efeito foi secundário e apenas contribuiu para um maior aquecimento nas regiões localizadas. Grande parte da culpa, assinalou, ainda recai sobre a falta de vento.
À medida que uma crise silenciosa se desenrolava no mar, as massas de ar que viajavam sobre a superfície do oceano acumulavam calor e devastaram cidades por toda a Europa, com ondas de calor mortíferas de mais de 40 graus Celsius. Chuvas torrenciais devastaram partes de Espanha e do leste da Europa.
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