Em entrevista à Lusa na sexta-feira na capital norte-americana, à margem das reuniões de primavera do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, a ministra Vera Daves indicou que viu declarações públicas e publicações nas redes sociais da administração norte-americana a reiterar o seu compromisso e a sua visão de negócio relativamente ao Corredor do Lobito, acrescentando que isso ficou evidente nas reuniões que manteve esta semana em Washington.
A ministra rejeitou sentir um distanciamento de Trump do continente africano, "pelo menos no que a esta iniciativa [Corredor do Lobito] diga respeito".
"Recebemos sinais disso durante as reuniões que tivemos. Não estou a falar só de publicações, estou a falar de palavras das pessoas com quem nos reunimos e que estiveram presentes em algumas mesas redondas nas quais participamos. De modo que eu acho que o compromisso político continua", avaliou.
Vera Daves afirmou que participou em várias mesas redondas sobre o Corredor do Lobito e as suas potencialidades, nas quais sentiu igualmente "que o interesse europeu continua vivo" em torno desse projeto, quer da União Europeia, quer de países bilateralmente.
Itália, referiu a governante, foi um dos países que mencionou expressamente o seu compromisso político com o Corredor.
"Sentimos também sinais positivos por parte dos Estados Unidos, o que significa que continua a haver interesse no Corredor", reforçou.
"Defendemos uma abordagem de não focar apenas naturalmente na linha férrea e no transporte de minerais. Mas, sobretudo, em transformar toda aquela zona num 'hub' económico, tirando vantagem das potencialidades relacionadas com a agricultura, com o turismo e com a indústria", explicou.
Nesse sentido, a missão angolana apelou ao Grupo Banco Mundial para que trabalhem juntos "numa perspetiva de identificar outras necessidades de infraestrutura" e, em parceria com o setor privado, atrair investimento privado para que "negócios surjam e empregos sejam criados" em torno da linha.
O Corredor do Lobito é uma infraestrutura ferroviária que atravessa Angola ao longo de 1.300 quilómetros ligando o Porto do Lobito (litoral) à fronteira com a República Democrática do Congo para escoar a produção de minerais críticos das regiões do Copperbelt (RDCongo) e Kolwezi (Zâmbia).
A operação é assegurada pela Lobito Atlantic Railway (consórcio que integra a portuguesa Mota-Egil, a suíça Trafigura e a belga Vecturis), e deverá contar com um investimento de quase mil milhões de dólares, parcialmente financiados pela agência de financiamento norte-americana Development Finance Corporation (DFC) e pelo Development Bank of Southern Africa.
O Governo de Donald Trump anunciou recentemente o corte de vários apoios ao continente africano, incluindo a suspensão de alguns projetos da agência norte-americana USAID que estavam associados ao Corredor do Lobito e direcionados para o apoio às mulheres agricultoras.
Analistas alertaram que o recente congelamento da ajuda humanitária e ao desenvolvimento por parte dos Estados Unidos pode fomentar uma aproximação dos países da África Austral, região que inclui Angola e Moçambique, à China.
Acerca das relações com Pequim e Washington num momento em que se intensifica a guerra comercial entre essas duas potências, Vera Daves garantiu que Angola "não tem que ter amigos preferidos" e que "é um país soberano, que tem parceiros e que tem legitimidade de se relacionar com qualquer nação soberana", embora "gostando de ter boas relações com toda a gente".
Ainda sobre a sua deslocação a Washington, Vera Daves admitiu que questionou o FMI sobre opções de novos programas com essa instituição financeira, indicando que sentiu "abertura" do FMI para essa possibilidade, apesar de frisar que se trata ainda de conversas informais.
"Ainda temos que trabalhar para olhar para as opções disponíveis e eventuais montantes. Ainda é tudo muito informal, não foi feita nenhuma solicitação formal por parte do Governo. Mas ainda assim, na informalidade, vamos começar já a partilhar alguma informação para que depois o Ministério das Finanças esteja em condições de melhor aconselhar o Governo a respeito do caminho a seguir, em função das fragilidades e das necessidades de tesouraria que tenhamos", explicou a ministra, sem avançar mais pormenores.
Questionada pela Lusa sobre se uma ida aos mercados está em cima da mesa, Daves negou, para já, essa possibilidade.
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