"Ela ajudava-me com explicações, conselhos (...). Ajudou-me muito", explicou Francisco na entrevista difundida pelo canal 13 da Argentina, segundo a agência de notícias espanhola Europa Press.
A entrevista foi conduzida pelo jornalista argentino Nelson Castro, que trabalha para os canais 13 e Todo Noticias, de Buenos Aires, e que escreveu o livro "La salud de los papas" (A saúde dos papas).
O livro, publicado em 2021, inclui um capítulo sobre Francisco, que contém informações que o próprio Papa lhe referiu na entrevista divulgada na terça-feira.
Segundo o jornal Clarín, o Papa pediu a Castro que não divulgasse os áudios da entrevista antes de morrer.
No diálogo com o jornalista, Jorge Mario Bergoglio afirmou que nunca se submeteu à psicanálise, mas que consultou uma psiquiatra durante alguns meses durante a ditadura, quando era o superior da Companhia de Jesus no país sul-americano.
"Foram tempos difíceis porque havia a ditadura, o problema do resgate de pessoas, as pessoas escondidas... Havia coisas que eu não sabia como lidar bem", afirmou, também citado pela agência de notícias espanhola EFE.
Explicou que a psiquiatra o ajudou a "clarificar certas coisas" e a enfrentar certos medos que lhe surgiram.
Deu o exemplo de quando teve de transportar pessoas procuradas pela ditadura escondidas no carro e passar por vários postos de controlo militar.
Defendeu que as neuroses são companheiras para toda a vida.
"Uma vez, li um livro que me fez rir à gargalhada: 'Alegra-te por ser neurótico'. Ou seja, é bom saber onde é que os ossos espirituais estão a ranger. Neurose é querer fazer tudo rapidamente. Não, [deve ser] devagar. É preciso conhecer", afirmou.
Relativamente à ansiedade, disse que a tinha dominado e conseguido que não o afetasse.
Francisco considerou que "todos os padres devem saber alguma coisa sobre psicologia humana".
"Às vezes, alguns sabem-no por sabedoria natural, porque são sábios, mas estudar psicologia hoje é necessário para o trabalho pastoral. Na altura, ajudou-me a esclarecer certas coisas, mecanismos, certos medos que eu tinha", referiu.
Durante a entrevista, Francisco contou alguns aspetos do conclave de 2013 e disse que sentiu paz nas rondas de votação que concluíram com a eleição como Papa.
Quanto ao nome que escolheu, disse que um cardeal foi ter consigo e disse: "Não te esqueças dos pobres".
"E eu fiquei ali a pensar, pobre, pobre... São Francisco! E foi então que o nome veio ter comigo", explicou.
Francisco contou que não costumava sonhar quando dormia, mas, quando acontecia, sonhava com coisas bonitas ou recordações boas.
Confessou que dormia "como um tronco", sem precisar de tomar medicamentos.
"Por volta das nove horas, deito-me, leio até às 10 horas, apago a luz às 10 horas e às quatro [da manhã] levanto-me", disse.
"Acordo sozinho. Tenho o despertador. Mas acordo sempre três minutos antes de o despertador tocar, porque o cérebro tem um relógio especial", contou.
Francisco falou também dos sentimentos de tristeza que experimentou ao longo da vida, como a morte do pai e a morte da mãe, que "são tristezas profundas".
"Se alguém é autêntico no sofrimento, tem de dizer: 'bem, estou a sofrer'. Diz a verdade a si mesmo, mas o sofrimento não desaparece", referiu.
Francisco disse ainda que o que mais o afligia era "a dor dos outros".
"As crianças que estão a morrer de fome e em países que poderiam resolver o problema. As crianças-soldados. O problema das crianças toca-me muito. E também o problema dos idosos. Os idosos abandonados", explicou.
O funeral do Papa Francisco realiza-se no sábado e o sucessor será escolhido de entre 135 cardeais que se reunirão num conclave ainda sem data marcada.
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