Em comunicado, as duas organizações elogiam a iniciativa da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) de elaborar a estratégia, mas lamentam que tenha surgido tarde - está prevista "há 18 anos" - e que "entre em campo a meio do jogo", uma vez que a consulta pública apenas terminou na semana passada, quase a meio do ano.
A ZERO - Associação Sistema Terrestre Sustentável - e o Conselho Português para Saúde e Ambiente (CPSA) consideram que o combate ao ruído ambiente "continua a ser desvalorizado" e lembram que "vários municípios não aplicam os instrumentos de gestão de ruído legalmente previstos".
Apontam ainda a falta de harmonização na elaboração da estratégia, assim como o facto de as "medidas de atenuação" serem escassas e terem "efeitos reduzidos".
"A nível europeu, o ruído ambiente é reconhecido como a segunda principal causa ambiental de impactos negativos na saúde e no bem-estar, a seguir à poluição do ar", recordam as organizações, que dizem que a estratégia apresenta alguns dados desatualizados (valores de 2017).
No caso da população exposta ao ruído por causa dos aeroportos, dizem que Estratégia Nacional para o Ruído Ambiente 2025-2030 (ENRA) tem "incongruências significativas" relativamente ao Relatório do Grupo de Trabalho dos Voos Noturnos (2022), elaborado para o Ministério das Infraestruturas e para a Assembleia da República.
"Sugere que a estratégia esteja a subestimar o valor total do número de vítimas", consideram.
Como exemplo, dizem que o relatório indica que, em 2019, apenas na Área Metropolitana de Lisboa, cerca de 72.683 pessoas estavam expostas a níveis de ruído superiores a 55 dB(A) entre as 23:00 e as 7:00, mas a ENRA refere, para todo o país em 2017, apenas 34.100 pessoas expostas ao mesmo nível sonoro e no mesmo intervalo temporal.
Para níveis superiores a 45 dB(A) no período noturno - a Organização Mundial de Saúde estipula 40 dB(A) como valor máximo - a discrepância "é ainda mais expressiva", consideram, exemplificando: 388.000 pessoas (segundo o relatório dos voos noturnos) apenas na região de Lisboa, versus 267.200 pessoas para o conjunto do território nacional, de acordo com a ENRA.
"Caso os dados relativos a 2019 reflitam de forma mais fidedigna a realidade atual (...), estima-se que o tráfego aéreo na região de Lisboa poderá representar cerca de 14% de toda a população nacional exposta a níveis de ruído noturno superiores a 55 dB(A), ou cerca de 17% no caso de níveis superiores a 45 dB(A)", acrescentam.
Por fim, as organizações consideram que a estratégia define linhas de atuação positivas, mas continuam a faltar "medidas concretas" que assegurem o cumprimento do Regulamento Geral do Ruído e a "efetiva redução" do número de pessoas afetadas pelo ruído ambiente.
A ZERO e o CPSA apelam ainda à inclusão, na estratégia, de "mecanismos eficazes" que permitam resolver estruturalmente o problema do ruído, nomeadamente, a aplicação do "princípio do poluidor-pagador", lembrando que, nalguns países europeus, como a França, são já aplicadas taxas de ruído em setores como o da aviação, verba usada depois para contribuir para o isolamento sonoro das habitações afetadas.
Entre outras propostas, sugerem igualmente a definição de limites máximos de excedência para o ruído ambiente e a introdução de sanções para os municípios em incumprimento, lembrando a ausência, em muitas autarquias, de mapas de ruído, zonamento acústico ou de planos municipais de redução de ruído.
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