Os Estados Unidos são o maior cliente do café brasileiro, tendo importado em 2024, de acordo com dados do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), 8,131 milhões de sacas de 60 quilos (34% a mais do que em 2023), valor que representa 16,1% dos 50,4 milhões de sacas de café vendidas pelo país sul-americano.
Marcos Matos, diretor-geral do Cecafé, explicou à Lusa que o mercado acompanha as políticas comerciais de Trump com atenção, mas que os exportadores brasileiros realizam um trabalho conjunto com a National Coffee Association (NCA, sigla em inglês Associação Nacional do Café) dos Estados Unidos, com diplomatas e congressistas para antecipar riscos, pela importância que o mercado norte-americano tem.
"Hoje, a indústria do café representa 1,3% do PIB [Produto Interno Bruto] norte-americano" e esse setor da economia gera "praticamente 40 mil milhões de dólares [38 mil milhões de euros] em impostos federais, estaduais e outras formas de imposto", referiu.
Além disso, "são 2,2 milhões de empregos que a indústria do café gera nos Estados Unidos", ou seja, concluiu, "quem mais ganha com essa história toda, com as exportações, é a própria indústria norte-americana".
Tendo em conta estes fatores e dados e também "a proatividade [dos exportadores brasileiros], esperamos que para o café não haja nenhum risco como o que está a acontecendo com o aço", acrescentou o diretor-geral do Cecafé.
Gil Barabach, consultor de Safras & Mercado, considerou que a política comercial de Trump está mais voltada para outros segmentos da economia neste primeiro momento e deve incluir poucos produtos do chamado agronegócio.
"O produtor dos Estados Unidos tem um 'lobby' pesado e está na base [política e eleitoral] de Trump, e nesse início, o agronegócio deve ficar de fora [das taxas]. Além disso, os Estados Unidos não produzem café", disse Barabach.
Já Fabio Sato, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Café Solúvel (Abrics), lembrou que a balança comercial dos Estados Unidos com o Brasil é equilibrada, e não crê que exista, no curto prazo, possibilidade real de taxas sobre o café brasileiro.
"O Brasil exporta para os Estados Unidos mais ou menos a mesma coisa do que importa. Não estamos no topo da lista do Governo americano com relação às barreiras comerciais", considerou.
"É claro que é preocupante, mas se for criada uma barreira tarifária que valha para todos os grandes exportadores de café solúvel, ou seja, Brasil, Vietname e Indonésia, nós ainda estaremos no mesmo nível desse jogo", referiu.
A Abics registou um recorde de exportações em 2024, com 4,093 milhões de sacas de café solúvel, um aumento de 13% face a 2023, e os Estados Unidos concentraram 20% destas exportações.
Questionados sobre a possibilidade de todos os produtos do Brasil serem taxados nos Estados Unidos, por ser membro dos BRICS (grupo de países emergentes fundado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), alvo de críticas e ameaças de Trump, os especialistas reconheceram um cenário possível, mas também mencionaram a cautela do Governo brasileiro.
"Trabalhamos via agronegócio para conduzir esse assunto com a sensibilidade que ele merece. (...) Há riscos, sem dúvida nenhuma, em todas essas discussões geopolíticas, ainda mais sobre o BRICS, mas o café seria o último produto da lista", acredita Matos da Cecafé.
Ainda assim, referiu, "esperamos que o Governo brasileiro tenha a sensatez de lidar com esse assunto de uma maneira muito cuidadosa".
O Presidente do Brasil disse na sexta-feira que o seu país "vai reagir comercialmente" às tarifas sobre as importações de aço e alumínio anunciadas por Trump, admitindo uma queixa na Organização Mundial do Comércio (OMC) ou taxar os produtos que importa dos Estados Unidos.
Numa entrevista a uma rádio local, Lula da Silva falou do princípio da "reciprocidade" caso haja "qualquer atitude contra o Brasil", mas garantiu que não quer ter "qualquer atrito", afirmando: "Queremos paz, não queremos guerras".
O Brasil é um dos países afetados por um dos diplomas já assinados por Donald Trump, que prevê a imposição de taxas alfandegárias de 25% sobre as importações de alumínio e aço.
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