"Novo paradigma" na política fiscal alemã poderá ser "difícil de implementar"

O professor de Economia Internacional em Berlim Gonçalo Pina acredita que a política fiscal alemã enfrenta um "novo paradigma" com a reforma da Constituição, mas a sua implementação "vai ser difícil".

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Lusa
29/03/2025 11:17 ‧ há 3 dias por Lusa

Economia

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basicamente um reconhecimento de que este travão da dívida era uma má ideia, uma ideia ultrapassada. Os partidos do bloco central concordavam com isso, com a exceção dos liberais do FDP que já não estão no governo nem no parlamento. Era uma coisa que tinha de ser feita agora. Mas a implementação vai ser difícil", revela, comentando a aprovação da alteração da Constituição.

 

Menos de um mês depois das eleições antecipadas na Alemanha, o Bundestag (Parlamento alemão) aprovou um pacote de medidas inéditas fruto de um acordo entre os partidos União Democrata Cristã (CDU), o partido irmão na Baviera, CSU, o Partido Social Democrata (SPD) e os Verdes.

O objetivo desta alteração é aumentar o investimento na defesa e infraestruturas perante a guerra na Ucrânia e a pressão dos Estados Unidos. O travão da dívida tem sido um dos pilares da política financeira alemã.

O pacote incluiu a criação de um fundo de investimento de 500 mil milhões de euros para modernizar infraestruturas e estimular o crescimento económico.

"Sabemos que há vários problemas nas ferrovias, nas pontes, há problemas em todo o lado. Há vários atrasos em termos da digitalização (...) Outra coisa em que poderá ser gasto o dinheiro é em política industrial. Houve umas tentativas tímidas de fazer isto no governo anterior, que era dar subsídios a certas empresas para se localizarem e para criarem 'clusters' de atividade económica na Alemanha", aponta o professor da ESCP Business School de Berlim.

Anteriormente, a Alemanha obedecia a uma regra orçamental que não permitia que a diferença entre os gastos e as receitas públicas fosse grande. Alguns governos tentaram contorná-la, mas sempre impedidos pelo Tribunal Constitucional alemão.

O limite à capacidade da política fiscal do governo foi agora levantada com a nova alteração, mas resta saber qual o seu verdadeiro alcance.

"Mesmo antes de haver esta regra constitucional, este travão da dívida, a política fiscal alemã nunca foi intervencionista. Durante décadas sempre foi um modelo de evitar os gastos o mais possível. Temos consequências negativas hoje, como uma infraestrutura alemã com muitos problemas (...) Não haver um travão de dívida não é uma panaceia, temos de ver de facto o que vai ser implementado", sustenta Gonçalo Pina, em declarações à Lusa.

"Se a realidade geopolítica mudar, será mais difícil justificar gastos com a defesa. É possível que a implementação fique muito aquém daquilo que se anuncie agora", frisa.

Esta alteração da Constituição surge numa altura em que decorrem as negociações para a formação de uma nova coligação que dê origem a um novo governo depois das eleições que deram a vitória a Friedrich Merz, líder da CDU.

"Será talvez mais fácil [chegar a um acordo] porque os partidos estão mais alinhados, mas também porque as necessidades são mais exigentes. Temos os Estados Unidos a criar uma necessidade de união dentro da Alemanha, mas continua a pairar o fantasma da extrema-direita, da AfD [Alternativa para a Alemanha]. (...) Esta parece quase a última oportunidade dos partidos 'mainstream', centralistas, porem isto a funcionar. Mas não vai ser fácil. A Alemanha está em estagnação há vários anos e os problemas continuam, não é claro que vá mudar muito depressa. Por isso é um desafio muito grande para estes partidos", concluiu.

Gonçalo Pina admite não concordar com uma política mais frugal ou baseada em exportações.

"Uma das ideias de permitir mais gastos públicos é dar a oportunidade ao setor privado de crescer mais. Este era o motor da economia alemã, e a procura era externa. Há uma tentação de voltar a esse modelo, ele funcionou durante muitas décadas. A procura interna alemã é relativamente pequena para países desta dimensão, a externa é alta, comparativamente com a da França, por exemplo", esclarece.

"Mas parece claro que o mundo mudou, que a China já não está a comprar tanto os produtos alemães, que há muito mais concorrência. Isso faz com que seja preciso um novo modelo de desenvolvimento económico para Alemanha, não tão baseado no crescimento fruto da procura exterior, mas talvez do mercado interno europeu. A tentação vai estar lá, para voltar ao que era há dez anos. Mas o mundo mudou", concluiu.

Leia Também: Alemanha deverá recuperar protagonismo na Europa com novo governo

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