Uma entrevista dada na noite de quinta-feira à estação televisiva 12, de propriedade privada, por Nadav Argaman, o antecessor de Bar, provocou a ira de Netanyahu.
"Guardo para mim tudo o que se passou cara a cara com o primeiro-ministro. É claro que sei muita coisa", afirmou Argaman, evocando a época onde esteve à frente do Shin Bet entre 2016 e 2021.
Netanyahu tinha sido acusado em 2019 por corrupção, fraude e abuso de confiança em vários casos. O seu processo foi aberto em 2020 e está a decorrer com audiências todas as semanas.
"Se chegar à conclusão de que o primeiro-ministro decidiu agir em contradição com a lei, não terei escolha. Direi tudo o que sei", acrescentou.
"Estou muito perturbado pelo facto de o primeiro-ministro prejudicar deliberadamente a sociedade israelita e provocar fricções na população para governar", prosseguiu o antigo chefe da contraespionagem.
Netanyahu publicou nas redes sociais uma mensagem na qual acusou Argaman de "extorsão em direto na televisão" e "intimação de tipo mafioso".
Mas acusou também Ronen Bar de estar na origem desta "campanha de ameaças e fugas para a comunicação social" realizada com o objetivo de "o impedir de tomar as decisões necessárias para devolver a autoconfiança ao Shin Bet, depois do seu fracasso devastador de 07 de outubro" de 2023.
Coisa rara, o Shin Bet reagiu, em comunicado, para denunciar uma acusação "grave" e "destituída de qualquer fundamento" contra o chefe de uma agência do Estado cujo objetivo é designadamente o de "proteger a democracia".
As relações entre Netanyahu e Ronen Bar, que dirige o Shin Bet desde 2021, já estavam nitidamente tensas antes do ataque do Hamas, de 7 de outubro de 2023, por causa, desde logo, de um projeto de reforma da Justiça muito controversa que dividia o país alguns meses mais cedo.
Mas tornaram-se insustentáveis depois da publicação, em 04 de março, de um relatório com um inquérito interno no qual a agência de segurança interna reconheceu falhas na recolha de informação, que teria permitido alertar as autoridades da dimensão do ataque inédito a Israel.
Mas este relatório critica também o governo, e Netanyahu indiretamente, considerando que "uma política (israelita) de acalmia permitiu ao Hamas construir um impressionante arsenal militar".
Netanyahu exigiu a demissão de Bar, cujo mandato expirou em outubro de 2026. Mas, segundo a imprensa israelita, este recusou demitir-se, deixando a Netanyahu a opção de o demitir, quando a guerra contra o Hamas na Faixa de Gaza pode regressar, se as negociações sobre o cessar-fogo, que decorrem em Doha, fracassarem.
Na expectativa, as funções de Ronen Bar foram limitadas. Vários meios avançam que foi excluído de uma reunião do gabinete de segurança e da delegação dos negociadores israelitas em Doha, liderado pelo seu adjunto, apenas conhecido pela letra M.
Bar e Netanyahu também estão em desacordo quanto ao futuro chefe do Shin Bet, com o primeiro a desejar que, como é hábito, seja sucedido pelo seu adjunto, enquanto Netanyahu quer controlar a nomeação.
Em filigrana, apontam os meios, está a questão da independência da agência de segurança, perante a tentação do primeiro-ministro de nomear um fiel que agiria em função dos seus interesses e não dos do país.
A oposição já denunciou a vontade de Netanyahu se desembaraçar da procuradora-geral, Gali Baharav-Miara, também conselheira jurídica do governo.
Esta defensora da independência da Justiça tinha considerado no final de 2022 que o projeto de reforma judicial de Netanyahu, acabado de regressar ao cargo, ameaçava fazer de Israel uma "democracia que tem o nome, mas não a essência".
Leia Também: Netanyahu vai à Hungria antes da Páscoa (apesar de mandado de detenção)