Hoje, em plenário, durante o debate na generalidade, os projetos do Livre e do BE tiveram o apoio do PS, PCP e PAN, bem como a esperada oposição do Chega. Os dois diplomas receberam também duras críticas do CDS-PP, mas PSD e Iniciativa Liberal garantiram a sua viabilização para discussão na especialidade.
Em junho de 2023, a Assembleia da República aprovou uma iniciativa do Livre para a criação do estatuto do apátrida, que teria de ser regulamentada num prazo de 90 dias. Porém, o processo legislativo foi interrompido com a dissolução do parlamento e convocação de eleições legislativas antecipadas.
Grande parte do debate sobre a regulamentação do estatuto dos apátridas decorreu de forma serena, com as bancadas da esquerda parlamentar a salientarem a importância de se proteger cerca de uma centena de cidadãos que se encontram sem direitos e, por isso, em situação de exclusão social.
Pela parte do PSD, a deputada Paula Margarido partilhou essas preocupações em termos de concessão de direitos elementares a este conjunto de cidadãos, mas falou em "expurgar" aspetos presentes nos diplomas do Livre e BE, por exemplo quanto à abertura de uma exceção para concessão da nacionalidade ao fim de três anos em território nacional -- um ponto duramente criticado por João Almeida do CDS.
Na mesma linha do PSD, o deputado da Iniciativa Liberal Rodrigo Saraiva adiantou que o seu partido se vai abster na votação dos projetos do Livre e do BE, na sexta-feira, na generalidade, estando disponível para os melhorar na fase de especialidade.
O debate subiu de tom e atingiu níveis de elevada agressividade verbal após a intervenção do presidente do Chega. André Ventura começou por acusar o Livre de pretender dispensar a apresentação de registo criminal aos apátridas candidatos à aquisição da nacionalidade portuguesa.
"Querem tudo o que é criminoso a entrar em Portugal. Diz-se até que quem nascer num barco com bandeira portuguesa tem direito à nossa nacionalidade", apontou.
O deputado do Livre Rui Tavares pegou precisamente na questão do registo criminal e lembrou o caso com o deputado eleito pelo Chega nos Açores, Miguel Arruda, constituído arguido por furto de malas no aeroporto de Lisboa.
"O Chega pede registo criminal aos seus candidatos a deputados?" Seguiu-se cerca de um minuto de gritaria no hemiciclo.
André Ventura contra-atacou e pediu "um teste de drogas ao deputado Rui Tavares".
"Não vou permitir esta escalada", interrompeu imediatamente o presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco.
Mesmo assim, Rui Tavares voltou ao caso do deputado Miguel Arruda, dizendo que "André Ventura ainda não pediu desculpa por trazido para o parlamento alguém que é suspeito de crimes".
"Estamos a discutir registo criminal. O Chega não pode vir a esta casa falar sobre bandidagem. Não deixaremos que isso [caso de Miguel Arruda] seja esquecido", acentuou, perante os protestos da bancada do partido de André Ventura.
No encerramento do debate, o deputado do Livre Paulo Muacho salientou abertura para melhorar o seu diploma em sede de especialidade e congratulou-se com "o passo que o parlamento se prepara para dar em defesa dos direitos humanos de mais de uma centena de apátridas residentes em Portugal".
A regulamentação do estatuto do apátrida foi também elogiada pelos deputados António Filipe (PCP), Inês Sousa Real (PAN) e Ana Sofia Antunes (PS).
Pela parte do BE, o líder parlamentar, Fabian Figueiredo, estimou em cerca de cem o número de apátridas existentes em Portugal, cidadãos "sem direitos essenciais e que se encontram em condição de exclusão social". E deixou um aviso:
"Este processo tem de ser encerrado com a maior celeridade. Queremos que Portugal seja uma República digna, que trata todos os cidadãos de forma igual", acentuou.
Leia Também: Mães despedidas? BE vê investigação "com bons olhos" e nega "ilegalidade"